15 definições de cultura organizacional
Escrito por
Leandro Duarte | Sócio da Nuts • Designer de Experiências • Mestre em Comunicação
Tenho estudado bastante sobre cultura organizacional ultimamente e reparei que, dependendo da conceituação de cultura que se usa, o nosso entendimento muda bastante e, com ele, nossa abordagem e o viés das decisões que podemos tomar numa relação profissional, numa negociação, num projeto ou mesmo numa equipe.
Vou, então, compartilhar algumas definições de cultura, de diferentes autores, que andei colecionando nos últimos meses. É uma espécie de menu para você escolher qual gosta mais, qual conversa mais com sua sensibilidade, qual funciona melhor para o momento que sua organização está vivendo.
Repertório x Experiência
São sempre vários os caminhos possíveis para se resolver uma mesma demanda. O segredo é tentar decidir mesclando o conhecimento das possibilidades com a experiência prática. O repertório teórico sozinho traz diversidade de alternativas e amplitude de insights, mas pode gerar ansiedade, pois você tem muitas escolhas e pode não saber qual efetivamente funciona melhor. Agora, se acrescentarmos ao conhecimento a experiência, a energia para fazer e a coragem de assumir riscos, errar e recomeçar, aí sim essa receita pode garantir o caminho do seu flow, com mais segurança para decidir e agir.
Aqui, eu vou colaborar com a primeira parte: o repertório. Vamos nessa?
Então, boa viagem.
A visão antropológica da cultura
Na Antropologia, onde o conceito de cultura surgiu, gosto muito da visão da antropóloga e cientista política paulista Eunice Durham. Ela parte da cultura como “natureza humana”, ou seja, uma conquista, uma vitória do ser humano sobre a natureza, um contraponto entre a civilização e a barbárie. Para ela, cultura é “um conjunto de regras e orientações construídas socialmente através de símbolos que permitiu ao ser humano governar seus impulsos, elaborar seu conhecimento, expressar seus sentimentos e paixões, organizar sua ação sobre o mundo e, enfim, viver em sociedade”.
Já o antropólogo californiano Clifford Geertz acrescenta as ideias de “transmissão” e de “comunicação” dessa construção social, cravando que cultura é “um sistema de concepções herdadas, expressas em formas simbólicas, por meio das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades em relação à vida”. Importante notar que “herdadas” é apenas uma metáfora, ou seja, Geertz não defende que haja qualquer caráter genético na transmissão da cultura.
A filósofa Marilena Chauí define cultura de forma quase poética como “a capacidade dos seres humanos de se relacionarem com o ausente”. É através dessa capacidade que só o ser humano tem de simbolizar ideias e sentimentos que a gente torna presente o que é passado, torna palpável o que é sonho, torna tangível o que é abstrato, cria os ritos que cristalizam as narrativas míticas, descreve os heróis que eternizam os comportamentos do nosso grupo, conta as histórias que verbalizam o nosso jeito “certo” de agir enquanto sociedade e, refletem os valores da nossa comunidade.
Cultura Organizacional
As definições de cultura organizacional variam bastante conforme a visão de cada autor. Por exemplo, a abordagem de um consultor tende a ser mais funcionalista, mecanicista, pois ele quer descobrir como manejar a cultura da maneira mais eficiente, visando atingir objetivos estratégicos. Aqui você pode se perguntar: “mas não é assim que deve ser sempre?”. Veremos que não, que outros autores adotam abordagens mais interpretativas, críticas, dialógicas, que partem de focos e ideias diferentes.
A visão dos consultores
Edgard Schein, mestre em Psicologia por Stanford, doutor em Psicologia Social por Harvard, professor do MIT e consultor, hoje com 94 anos, é um dos nomes mais famosos dos estudos de cultura organizacional. É dele aquela que eu considero a mais completa definição de cultura organizacional: “o conjunto de pressupostos básicos que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com problemas de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem o suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas”.
Outro famoso consultor em cultura organizacional, que era psicólogo social, diretor da IBM e professor de Antropologia Organizacional da Universidade de Maastricht, é o holandês Geert Hofstede. Para ele, cada pessoa aprende e assimila, durante a infância, padrões de pensamentos, sentimentos e comportamentos que dão origem a uma “programação mental” que indica quais serão as suas atitudes diante da vida. Assim, cultura é “a programação coletiva da mente que distingue os membros de um grupo ou categoria de pessoas face a outro”. Repare que o foco é no grupo, nas identidades, nas diferenças.
Outros autores seminais
Um dos precursores dos estudos de cultura organizacional foi o médico e psicólogo canadense Elliot Jacques que, já nos anos 1950, definiu cultura organizacional como “o modo habitual de pensar e agir, a forma costumeira e tradicional de fazer as coisas, que deve ser aprendida e compartilhada em proporção maior ou menor entre todos os empregados e que os novos devem pelo menos aceitar”. Me chama atenção quando ele diz “pelo menos aceitar”, pois dá a entender que se engajar, ou mesmo concordar, não é estritamente necessário para se conviver dentro daquele grupo.
John Thomas Eldridge e Alastair Crombie, na obra clássica “A sociology of organisations”, de 1974, afirmam que “a cultura de uma organização refere-se à configuração singular de normas, valores, crenças, modos de se comportar e outros elementos que caracterizam a maneira como os grupos e indivíduos combinam para realizar as coisas”.
Na mesma linha, o pesquisador Paul Sanchez define cultura como “a soma total de como uma organização leva a cabo tudo o que ela tem que fazer para alcançar seu propósito ou sua missão”.
Maurice Thévenet, professor da Essec Business School, resume cultura organizacional como sendo “uma maneira específica de a empresa responder aos seus problemas”.
Kim Cameron e Robert Quinn, autores que criaram um famoso modelo de tipologias de cultura organizacional, a descrevem genericamente como “algo que define os valores centrais, pressupostos, interpretações e enfoques que caracterizam uma organização”.
Acrescentando camadas
Andrew Brown, no livro “Organisational Culture”, de 1998, diz que “cultura organizacional refere-se ao padrão de crenças, valores e meios aprendidos de lidar com a experiência que tiveram durante o curso da história de uma organização, e que tende a ser manifestada em seus arranjos materiais e no comportamento de seus membros”. Aqui, duas perspectivas essenciais são introduzidas: a “historicidade”, ou perspectiva sócio-histórica, que traz o desenvolvimento temporal cíclico da organização como eixo fundamental; e a “materialidade”, que joga luz nas condições materiais efetivas que a organização enfrenta.
Para o professor da FIA Robert Henry Srour, “a cultura organizacional é o conjunto das representações mentais, o universo simbólico, o modo de ser próprio dos habitantes de uma organização que determinados padrões de comportamento expressam”. Ele complementa a definição acrescentando que a cultura “impregna todas as práticas e constitui um conjunto preciso de representações mentais, um complexo muito definido de saberes. Forma um sistema coerente de significações e funciona como um cimento que procura unir todos os membros em torno dos mesmos objetivos. Isso os torna semelhantes nos modos de agir e, muitas vezes, de pensar. Confere sentido aos discursos e às práticas. Especifica a identidade da organização construída ao longo do tempo. Serve de chave para distingui-la de outras organizações.”
Maria Tereza Leme Fleury, professora da FGV, incorpora a dimensão política, a perspectiva ideológica, ao definir cultura organizacional de forma crítica como “um conjunto de valores e pressupostos básicos expresso em elementos simbólicos, que em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a identidade organizacional, tanto agem como elemento de comunicação e consenso, como ocultam e instrumentalizam as relações de dominação”. Aqui a cultura, além de revelar e orientar o jeito escolhido de se pensar e agir, serve também para ocultar certas verdades incômodas, como as contradições inerentes ao trabalho.
A última fronteira
Os pesquisadores Janice Beyer e Harrison Trice definiram cultura organizacional como uma “rede de concepções, normas e valores, que são tão tomadas por certas que permanecem submersas à vida organizacional”. Aqui é introduzida a ideia de que cultura é algo que simplesmente está lá, que a gente não percebe e apenas sente, respeita e segue.
Michael Pacanowsky, da Universidade de Utah, e Nick O’Donnell-Trujillo, da Universidade de Purdue, avançam ainda mais nessa ideia afirmando que “cultura organizacional não é apenas uma peça do quebra-cabeça, ela é o quebra-cabeça. A cultura não é algo que uma organização possui, mas sim algo que uma organização é”. Para eles, a cultura é a organização e a organização é sua cultura. Essa definição traz uma visão muito mais ampla sobre a dificuldade e a responsabilidade envolvidas em qualquer projeto de mudança cultural.
Para fechar
Bom, aqui eu tentei apenas apresentar um menu introdutório de conceitos. Certamente, muitos autores ficaram de fora. Então, que tal deixarmos essa conversa aberta para irmos colaborando e enriquecendo esse diálogo, adicionando novas ideias, perspectivas, caminhos e insights? Até porque, como eu disse no começo, aqui temos apenas conceituações de outros autores, mas experiência prática cada um vai ter a sua. E isso muda tudo.
Sendo assim, faço o convite para que você compartilhe comigo o que achou, o que pensou, o que sentiu e, principalmente, o que andou fazendo, tentando, errando e acertando por aí nas empresas. É assim que a gente constrói juntos o conhecimento.